Sou uma pessoa de poucos vícios e um deles é o café. O hábito veio tarde, lá pelos meus 21 anos, quando comecei a trabalhar. Ainda me adaptava à obrigação de ficar horas sentado. Aproveitava a pausa para o café para esticar as pernas e esfriar a cabeça. Não dava qualquer importância para a qualidade. Bastava que estivesse quente.
Só fui descobrir o que era um bom café quando comecei a frequentar a casa da minha futura mulher, pois seus pais apreciavam a bebida. Na minha própria casa, sempre preferi tomar chá – continuo gostando e cultivando preferências, mas isso é papo para outra hora.
Ao me mudar para São Paulo, cheguei à Terra do Café sem nenhum requinte. Bebia o que estivesse mais próximo. Na instituição onde eu trabalhava, diariamente às 8h30, havia um carrinho que desfilava com pão com manteiga e café quente. Foi a partir dessa época que comecei a notar a diferença. Ao longo do dia, uma copeira servia mais quatro cafés e passei a me servir de todos. Isso foi antes dos cortes de pessoal provocados pelo Plano Collor.
Nos passeios aos shoppings, naqueles primeiros anos, aderi à pausa para o café e em pouco tempo já distinguia algumas coisas. Passei a procurar a bebida em determinados lugares. Tornou-se um gosto – São Paulo me fez tornar mais exigente. Afinal, o café faz parte da cultura local e é a cara da cidade. Sempre invejei o charme dos cafés portenhos, onde se pode ficar conversando sem pressa, saboreando uma xícara quente e deliciosos biscoitos. Mas a pressa paulistana e o enorme apetite dos moradores da cidade nos brindavam com maravilhosas lojas de doces dotadas apenas de duas ou três mesas desconfortáveis. Era o que havia e a gente aproveitava da melhor forma possível.
Lá pelo início da década de 1990, o expresso e o cappuccino despontaram como preferências nos bares e depois das sobremesas nos restaurantes. Paralelamente, a abertura comercial começou a permitir que eu comprasse chás ingleses, mas volto a falar sobre isso em outro dia.
A melhoria do café servido nos Estados Unidos, importado da Colômbia, mexeu com os brios dos nossos produtores, que passaram a oferecer ao comércio grãos de melhor qualidade. Hoje em dia, mesmo as marcas tradicionalmente encontradas nos supermercados costumam oferecem dois ou três tipos de sabores e intensidade. O público se tornou mais exigente, em especial, no final dos anos 1990, com a globalização galopante, que trouxe consigo, entre outras coisas, a disseminação das máquinas caseiras de expresso e cappuccino.
E com o advento da rede Starbucks, sucesso em todo o mundo, percebeu-se talvez tardiamente que lugares para se tomar café ou outra bebida quente sem pressa, em ambiente agradável, podia ser uma boa aposta comercial.
Mas até os tradicionais botecos com xícaras escaldadas e pires de alumínio sobrevivem oferecendo um cafezinho melhor do que aquele de trinta anos atrás. Felizmente, não são a única opção.
Seja no cenário descolado das cafeterias ou no botequim, ficaram no passado os famosos cinco Fs (fraco,frio,fedido, com formiga no fundo). Para viciados assumidos como eu, isso é um avanço imenso.
Agora uma coisa faço questão de registrar. O ambiente do Starbucks é simpático e legal, mas o café… Na minha opinião, ele é bom para a garotada que gosta daquelas misturas. Para mim, não há nada que se compare a um expresso bem tirado. Sem açúcar, é claro.