Lotação esgotada

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Rio I

De repente a população se deu conta de algo que economistas já notavam há algum tempo e outros previram há dois anos: o Rio de Janeiro está caro demais! Sob alguns aspectos, porém, essa afirmação é falaciosa e aí vem à tona algo que o carioca não quer ver. Estamos de saco cheio dessa tal  vocação para cidade turística. Há alguma novidade no fato da cidade ficar mais cara quando têm turistas? Não. Há alguma novidade que os serviços públicos aqui sejam tão ruins quanto no Maranhão? Não. Há alguma novidade que os serviços privados sejam deficientes porque a mão-de-obra é mal qualificada, pouco ambiciosa e com frequência indolente? Não. A novidade reside no calendário que, este ano, esticou muito o período entre o réveillon e o carnaval, acrescido logo em seguida por mais uma semana de feriados em abril e, então, a Copa do Mundo. Resultado: um aumento no número de visitantes que se espreme em uma área restrita a, no máximo, dez quilômetros quadrados. A consequência é que tudo funciona de forma mais precária e com um custo mais alto.

Ao mesmo tempo, o afluxo de visitantes também tem um impacto no bolso  do carioca. Por enquanto, temos uma relação de amor com o dinheiro do turista e ódio a seu dono.

Quando se fala sobre o descontrole dos preços praticados na cidade, é preciso levar em conta que muitas vezes estamos nos referindo exclusivamente da Zona Sul. O Rio dos cartões postais se limita, a rigor, à orla e às áreas mais nobres da cidade. É fato que, desde a Idade Média, fazer parte da nobreza sempre custou caro. A geografia e as peculiaridades topográficas locais dividem o território em alguns feudos. No subúrbio, a vida prossegue com todas as carências possíveis e imagináveis, com menos ar-condicionado para aplacar o calor de verão. Na Zona Norte, o aumento dos preços já se faz sentir. É lá onde se concentra a classe média nativa, mais tradicionalista e conservadora, menos preocupada com o lançamento de modismos. Há o Centro, onde os preços subiram, mas ainda se come um pouco mais barato e onde se concentra a atividade econômica da cidade. Há também a Barra, praticamente outra cidade, com seus habitantes e costumes, local onde a maior reclamação diz respeito ao trânsito. Um trânsito que parece paulista, em que as vias de acesso à Zona Sul são as mesmas desde 1960! A própria Zona Sul, por sua vez, poderia ser dividida em três ou quatro microrregiões.

E é da Zona Sul que vem toda a gritaria sobre os aumentos. Reclama-se de como está caro comer fora, sobre os preços praticados pelos barraqueiros na orla, o custo das diárias nos hotéis e sobre os valores dos aluguéis.

Rio III

Que parte do Rio está reclamando mais?

Quando vi nossos políticos e representantes vibrando como antigos torcedores da geral do Maracanã nas duas cerimônias em que fomos escolhidos como sede da Copa do Mundo e das Olimpíadas, confesso que meu pensamento dirigiu-se para o transtorno que seria causado pelas obras, da pior maneira, e não estava errado. Além de prever os sobrecustos e custos extras e os custos “por fora”. Posteriormente, com calma, juntando todas as peças macro e microeconômicas, muitos perceberam que o Rio de Janeiro ficaria inviável. E está mesmo, porque é inevitável. Não há espaço para todos e o bom serviço nunca foi tradição local!

OK, estou rabugento com a minha cidade, mas não estou sozinho! A farmácia do bairro está cheia, a padaria demora a atender, os supermercados têm filas de 25 minutos no caixa, não há lugar que não tenha dobrado os preços… Todo mundo reclama! E os turistas? São a gota d’água! E uma triste constatação: vai piorar!

Como economista, costumam me perguntar se vejo alguma solução para a cidade. A resposta é simples: não.

Talvez se derrubarem muros invisíveis e entenderem que a cidade não é um pequeno pedaço da Zona Sul onde nasceu a bossa nova, a situação melhore.

Talvez se o nativo parar de sacanear a urna de votação, tenhamos um alívio no longo prazo. Talvez se nos dedicarmos de verdade aos serviços, aprimorando-os sem “jeitinho”, sem tirar “vantagem”, ou coisas assim, possamos nos orgulhar de sermos realmente gentis e amigáveis desde a primeira conversa.

E antes que teorias heterodoxas como tabelamentos, congelamentos, ou fiscais do Sarney apareçam, lembrem-se, para baixar o preço da água de coco é preciso que tenham muitos lugares vendendo o produto. E é preciso também entender que o Rio tem muito mais a oferecer do que sua bela paisagem.

Após os eventos extraordinários, a cidade continuará com um réveillon que traz mais de um milhão de pessoas para cá, com um carnaval movimentado e beleza o ano todo. Precisamos entender que essa é uma vocação real e aproveitá-la, mas não deixar que se aproveitem de nós.

Se puderem, lembrem que residem na cidade duas autoridades. As duas deveriam trabalhar pelo menos um pouco: o prefeito e o governador. Do jeito que a coisa anda, não passam de feiosas figuras decorativas, fora de uso. Quem sabe, se dermos corda “nas costas”, assim como nos brinquedos de antigamente, eles não resolvam se movimentar?

No final das contas, que São Sebastião nos proteja dessa nova “invasão”. Não há necessidade de flechá-lo mais.

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