Não era para chover!
Estavam os dois sentados num banco de frente para o paredão negro em que o mar se transformava de noite. Viam a espuma branca das ondas, sentiam o cheiro de maresia, e riam de tudo que falavam. Era quase uma espécie de duelo para ver quem seria mais rápido na troca de frases curtas, sempre com o objetivo de deixar o outro sem graça. Conheciam-se havia muito e isso dava enorme sensação de intimidade e, claro, sempre suscitava a frase tradicional:
– A intimidade é uma merda – e riam de novo, concordando.
– Tá chovendo…bastante… – ele observou.
– Deixa de frescura…peraí eu tenho um guarda chuva micro aqui dentro…
Aquela bolsa minúscula que ela elegantemente usava parecia conter de tudo. Ele nem sabia mais o que sairia de lá.
– Minhas costas estão ficando molhadas. Você vai cuidar da minha pneumonia.
– Com prazer… Já disse: vai parar. É uma nuvem passageira…
– Ahhh! Tá bom! Só que não!!
Depois de bem molhados e ainda rindo, saíram dali. O lugar estava absolutamente deserto, exceto por alguns pescadores que teimavam em tentar algum sucesso.
Caminharam até a casa dela.
– Entra, vamos secar enquanto bebemos alguma coisa.
Com um pouco de frio, sentaram-se e continuaram a conversar sobre tudo e todos. Mas sentiam que havia uma tensão no ar. O vinho acabou por tornar a conversa ainda mais relaxante. Mudaram as cadeiras de posição para debaixo do toldo, na varanda. Assim viam a chuva caindo. Ficaram de frente, olhando-se nos olhos. Os dela diziam muito para ele e ele não sabia mais se olhava o sorriso tentador ou os olhos sedutores. Ela provocava com gestos, palavras, sorrisos e piscadelas.
Como se estivesse tudo combinado no destino de cada um, os olhos se fecharam, as mãos tocaram as nucas, o beijo foi suave como deve ser o primeiro, mas com temperatura elevada com se previsse algo mais.
Eles se olharam, nada falaram, sorriram timidamente, voltaram a se beijar e ao mesmo tempo prestaram atenção na música que tocava pelo celular dela. As respirações se aceleraram.
– Será que podemos ter uma música, mesmo sem ser adolescentes?
– Qual o problema? E depois ninguém vai saber, mas vou escutá-la por muito tempo.
– Eu também…
– Voltou a chover forte…- ele observou, um tanto preocupado com a volta para casa.
– Me passa seu copo. – ela prolongava cada instante dele ali ao lado.
Ele não cansava de admirar sua boca e seu sorriso, nos entremeios dos beijos mais longos e dos corpos se entregando.
– Eu… – ele ia começar a dizer alguma coisa importante. Mas ela o interrompeu com firmeza, doce e cheia de razão:
– Fica quietinho…e me beija.