Simples assim

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Comum III

Dessa vez fui com decisão. Dei a volta na pista de dança, mas ainda não sabia o que dizer para ela. Quando cheguei ao balcão de bebidas, ela se virou e disparei:

— Você vem sempre aqui?

Imediatamente fiquei vermelho. Que pergunta mais clichê e totalmente sem noção!

A gargalhada dela foi tão sonora que pareceu abafar o som alto da música.

— Gosto de caras com senso de humor. Você ganhou um bônus e pode fazer mais uma pergunta.

Um misto de alívio e susto. Rapidamente, considerei pedante a resposta. Ela tinha me chamado a atenção desde que eu havia chegado naquela festa, mas agora o que eu queria era sair daquela situação.

— Quer dançar?

— E a bebida?

— Depois peço outra pra você.

— OK

Eu gosto de dançar olhando para a pessoa. Ela olhava para baixo, admirando seus próprios movimentos. Difícil sair daquela situação. A música foi acabando e antes de emendar na próxima, falei ao seu ouvido.

— Vou pegar a sua bebida.

— Nossa! Que perfume bom! Gosto de homem perfumado.

— Obrigado!

— Está aqui outro uísque com um pouco de água e gelo.

— Você reparou no que eu bebia tão rápido assim?

— É… Vou buscar alguma coisa para mim.

Era minha chance de dar um “perdido”, mas bateu remorso. Voltei.

Ela conversava animada com outro cara.

Pensei alto:

— Então sem remorso.

Fui andando para longe da música.

— Escolha errada.

Virei-me para ver quem falava e se era mesmo comigo. Um rosto comum, uma roupa comum, um sorriso comum, uma voz comum, um perfume comum. Não consegui encontrar o que dizer. Ela insistiu:

— Ela não quer ser escolhida. Quer escolher. As pessoas podem ser divididas assim, não acha?

Ainda sem resposta, eu procurava entender o que me atraía naquela mulher.

— Mais ou menos como caça e caçador? – perguntei timidamente, tão baixo que ela mal pôde escutar.

— Não! A caça foge e o caçador só quer a conquista. Eu falo de escolher as pessoas que se quer por perto ou de ser escolhido por alguém que não se quer por perto.

— Não entendi muito bem, mas aceito o argumento.

— Paulinho da Viola…

Comecei a rir. Gostei da resposta e tudo aquilo que achei comum se tornou diferente.

— Então você me escolheu?

— Claro! Quase me decepcionei com você, mas percebi que estava desconfortável.

— Muito desconfortável. Aliás, desconfortável demais.

— Quer dançar?

— Vamos.

Ela olhava para mim e sorria. De repente, minha vontade era beijá-la até jogarem água fria na gente.

Até hoje ela me olha nos olhos, sempre. E é deliciosamente, extraordinariamente comum.

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