Era uma manhã gelada. Daquelas em que o céu fica azul demais e o sol brilha fingindo que esquenta, coisa típica de inverno nova-iorquino. Batia um vento gelado que às vezes incomodava e às vezes só servia para desarrumar o cabelo. Eu esperava que ela saísse de outra loja antes de partir para o passeio mais ingênuo do mundo, programado para aquela ocasião. Ela queria ver o urso polar nadando no zoológico do Central Park. Parecia uma menina ao demonstrar alegria diante do tempo que teríamos para ficar juntos e do programa inocente e diferente.
Entramos no parque pela 59th Street e tivemos que fechar os casacos mais ainda, porque aí o vento soprou forte. Andávamos pelas trilhas e tudo estava absolutamente branco, branco de doer os olhos, com o sol refletindo-se na neve. A calma de não ter hora para nada nos impelia, nos inebriava. A paisagem era perfeita para beijos melados por protetor labial.
Aos vinte e poucos anos, ela mantinha uma orelha eternamente ocupada com fone de ouvido e, de vez em quando, ensaiava passos de dança mesmo com as luvas entrelaçadas. Sua felicidade e seu sorriso eram contagiantes. A cada esquilo que passava pulando no meio da neve seguiam-se pedidos insistentes de fotos, prontamente atendidos, é claro. Eu não pensava em nada. Minha cabeça curtia cada momento, um de cada vez, e era isso o que me extasiava.
De repente, ela emitiu um grito daqueles de adolescente quando vê o ídolo na televisão:
— Escuta só! É a música, a que gente dançou na festa…adoro…nunca mais vou ouvir sem pensar em você.
O que responder? Nada, é óbvio. Só consegui abrir um daqueles sorrisos de idiota apaixonado.
Ficamos abraçados, cada um com um fone, dançando e se beijando…
— Do you want a picture, guys?—A pergunta foi feita por uma menina de uns doze anos com olhos pretos e um gorro vermelho.
— Sure! Thanks.
Respondemos juntos, quase ao mesmo tempo, rindo de novo como crianças. Com a máquina que ela entregou para a pequena, foram tiradas duas fotografias. A menina deu um beijo nela e disse:
— You make a nice couple!
Ao que ela atalhou:
— Depois do menino moreninho de cabelo liso e emburrado como o pai, quero ter uma menininha dessas… falando inglês.
Riu, me abraçou e me beijou o pescoço.
O que mais eu poderia pedir naquele momento? Que o tempo parasse. Que ele aproveitasse o frio daquela manhã e congelasse tudo. Que congelasse o mundo para sempre. Que o mundo parasse de girar. Nada mais mudaria. Nós viveríamos eternamente naquele estado de alegria permanente.
Seguimos rumo ao zoológico, vimos o casal de ursos pulando e nadando na enorme piscina. Ela não desgrudou de mim. Foi inesquecível.
De repente, senti um calafrio esquisito.
O mundo deveria ter terminado ali, naquele momento.
Mas o mundo não parou de girar. Voltamos a São Paulo. Houve uma briga. Nunca tive a chance de ver as fotos.