Todos os usuários de planos de saúde, dos mais exclusivos aos mais populares, sem exceção, já encararam esperas nas recepções dos laboratórios credenciados.
Se seu exame foi de manhã, é provável que você tenha assistido à Ana Maria Braga às 8h30, preparando buchada de bode enquanto seu estômago ronca de tão vazio. Mais tarde era a vez de Xuxa, aos berros:
— Parabéns, parabéns, hoje é seu dia…
De volta ao atendimento:
— PRÓXIMO!
— Bom dia!
— Autorização do exame…
Apresento o pedido um tanto constrangido.
— ESPERMOGRAMA, CORTOU NÉ?
— Como?
— Nada não, senhor…
– AÍ, ODETE O PAINEL PAROU, VAI TER QUE CHAMAR PELO NOME E NÚMERO.
– OK! O senhor imagina que é a terceira vez essa semana. Ninguém faz mais nada direito.
Concordo com a cabeça.
— O senhor pode aguardar o chamado.
Neste dia estava de paletó e gravata. Tinha uma reunião importante as 10h30.
Depois de vinte minutos:
— MAURO, NÚMERO 19, ESPERMOGRAMA!
Todos olharam e esperaram para ver o masturbador matinal. Tive a impressão que até as pessoas no estacionamento em frente paravam para saber quem era o infeliz.
Levantei-me e fui em direção ao balcão, passando do vermelho de vergonha para o roxo de raiva.
Entregaram-me um vidro do tamanho daqueles de maionese:
— Vá ali, na segunda porta à esquerda. Traga-me cheio.
Nem consegui responder e buscando autoconfiança perdida no meio daquelas cadeiras de espera, caminhei até o recinto.
Entrei. Vi um vaso sanitário, uma pia e um espelho, num ambiente sem janela. Fechei a porta, a luz acendeu e um sistema de ventilação começou a funcionar. De comprimento, o recinto tinha uns três metros; de largura, no máximo 1,80m, com pé-direito baixo, quase um forno de microondas mobiliado.
Olhei no espelho, já com calor. Estava de paletó e gravata, com a responsabilidade de encher um vidro de maionese e seguir para uma reunião importante em quarenta minutos. Tinha uma missão que nem mesmo Bond, James Bond, executaria sem dificuldade.
Minha imaginação estava nas receitas da Ana Maria Braga e na reunião. Também estava decidido: definitivamente não me olharia no espelho.
Sem dúvida, um adolescente já teria enchido o primeiro vidro e estaria pedindo o segundo. Mas aos 46 anos, minha idade na época, as coisas já não corriam como antigamente.
Concentração, muita concentração! Não vou dizer em quem pensei, mas tinha visto After the Sunset na véspera. Assim, pude cumprir o meu dever. Não, não enchi o vidro. O que importa é a qualidade, certo?
Fui para a reunião, mas confesso que o filme não saiu mais da minha cabeça.