Todos pensavam que aqueles dois mantinham um casamento-modelo. Era um engano. Algo acontecera no meio do caminho e a união se tornara um fardo, um equívoco tão grande que nenhum dos dois se reconhecia. Anularam-se em nome de uma relação que parecia apenas um suceder de acontecimentos certos, nas horas certas.
Nunca haviam cometido excessos. Nunca tinham dançado a madrugada toda. Nunca tinham tomado um porre juntos para comemorar ou apenas para se divertir. Nunca houve ocasião em que os presentes não eram os esperados, os desejados por cada um. Nunca houve choro convulsivo por nada. Nunca houve a certeza de que o outro era a única no mundo para envelhecer junto.
Ele não acreditava mais nas palavras que repetia automaticamente para ela. Fazia parte do costume. Era o esperado. O mesmo acontecia com ela, os “sim” e os “não” podiam ser programados com semanas de antecedência. Nada podia sair minimamente do lugar, pois qualquer sacudida provocaria um desmoronamento de tudo, até das máscaras.
Durante vinte anos, ele experimentou uma carreira ascendente. Obteve sucesso, patrimônio, reconhecimento. Ela permaneceu a seu lado, fazendo de tudo um pouco, sempre bem e satisfeita. Nasceram os filhos. Os amigos admiravam a união.
Nunca discutiram. Nunca divergiram diante de outras pessoas. Nunca disseram palavras que não fossem de admiração pelo outro. Nunca tomaram decisões individualmente. Nunca deixavam de ser carinhosos em casa e em público. Nunca eram melosos. E mais importante: nunca deixaram de manter um profundo respeito mútuo.
Mas aquilo tudo era raso.
No íntimo, os dois sabiam que em algum momento, mesmo que nenhum problema acontecesse, eles se tornariam simplesmente bons amigos. Nem aquela bobagem que se costuma dizer sobre cumplicidade entre casais. Os sentimentos simplesmente não tinham se aprofundado. Ele ressentia a falta de entrega da parte dela, principalmente nos momentos íntimos. Ela estava convencida de que o único compromisso dele era com ele mesmo. Quando fatos externos afetaram o equilíbrio delicado, o vale que se abriu entre eles era grande e árido. Diante de uma rasteira da vida, a distância entre eles se ampliara, se tornara intransponível.
Não sobrou sequer espaço para lágrimas.
Cada um sentia a dor pela perda de tempo, pela falta de calor para sequer discutir. O silêncio doía. Mas não havia mais o que ser dito.
A vida ensina, ajuda, mostra, mas quando ela pune, por qualquer motivo que seja, só o que é realmente sólido sobrevive. Não havia entre eles nada de real.
Restava a cada um seguir o seu caminho em busca de algo mais autêntico. Seria preciso recomeçar por dentro, aquecendo corações desacostumados a perdas, sem sintonia com as oscilações das emoções, sem vontade de correr o risco de amar e ser amado.
Seria preciso abrir mão para sempre daquela falsa impressão de segurança.
Mas primeiro enfrentariam o nada.
Bom estou só e gostei do que li a vida á dois é dificil para da certo tenque ter amor..