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Sem ter planejado, acabei combinando o último gole de um dry martini, com o acorde final de “The Way You Looked Tonight” com Tony Bennet enquanto o relógio marcava meia-noite do dia 31. Restava esperar pelo final anunciado, um fogaréu que a tudo consumisse em segundos, sem dar tempo de pensar ou sentir dor.
Silêncio. Ninguém soltava fogos. Ouvia-se apenas o tique-taque do relógio.
Segundos se passaram. Minutos se passaram.
Nada.
Seria possível que todos tivessem errados? Os cientistas, os astrólogos, os maias?
Um sentimento estranho, meio esquecido, foi chegando devagar, junto com a sensação de que havia esperança, de que algo de novo e improvável ainda podia acontecer. Era alegria.
O acerto de contas estava feito. Tudo novo. Seria possível que isso acontecesse?
Saí de casa assim como tantos outros. A rua enchia-se. Cada um parecia tomado por uma ideia, cada um parecia ter um lugar para onde se dirigir naquele preciso momento. Com atraso, os fogos de artifício começaram a explodir, a colorir o céu que era de um azul quase negro.
Caminhei em direção à praia, a alegria já se transformando em euforia ainda contida. Liguei para minhas filhas. E pensar que quase estraçalhei o celular em um momento de revolta pouco antes da meia-noite.
— Filha! É o recomeço!
As lágrimas vieram, não consegui falar.
— Te amo, pai.
Foi tudo o que escutei no meio da barulheira.
Uma imensa festa tem início, do nada, na areia.
Ao perceber as variadas emoções da multidão, começo a acalmar os ânimos e a pensar em como deverá ser a vida daqui por diante. Como serão as relações entre as pessoas, depois de esperar por um apocalipse que não veio? Paro de pensar no todo. Penso em mim. Como serão as minhas relações? É uma pergunta importante. Reconheço que os últimos anos foram de relações pessoais tumultuadas e sem rumo definido, isso não vai mais acontecer. Ah, se pudesse decretar… mas vou tentar. Resolvo olhar a festa, aproveitar e deixar para pensar nisso depois. Não vejo uma expressão de alegria tão nos rostos das pessoas há muito tempo. Ninguém preocupado com o tipo de música, roupa, em ser ou estar bonito, era uma alegria diferente, uma leveza que torço para que dure.
Mais um nascer do sol na Pedra do Arpoador, lotada como a geral do velho Maracanã em dia de Fla x Flu. Hora de voltar para casa e, no caminho, pensar nas resoluções para uma nova vida.
Nesses recomeços somos levados a querer ser mais generosos, participar mais de movimentos coletivos, dar mais atenção ao espírito, tratar bem de corpo que nos foi dado, enfim coisas que eu já cansei de ouvir. Estaríamos vivendo o início de outra era, sem a destruição total da anterior? Então o momento seria de aproveitar o que a vida tem de bom e de novo tentar ter mais momentos felizes. Sei que descobri alguns caminhos novos. Entendi, depois de muito bater cabeça, que a maioria das vezes a simplicidade nos guia. Disso não abrirei mão.
As resoluções desse amanhecer não estarão limitadas ao novo ano, e sim a um novo espaço de tempo que eu não saberia medir, mas com certeza não me prenderia mais.
Aliás, o certo seria não fazer qualquer resolução, ir levando as coisas conforme interesses e vontades que não comprometessem o longo prazo, mas que tentassem, de alguma forma, transformá-lo em um renovado tempo.
Todos esses pensamentos rodam na minha cabeça, que ainda tenta entender o que aconteceu, ou melhor, o que não aconteceu. Besteira. Chega de tentar entender tudo. Melhor aceitar as coisas como elas vêm – me parece uma maneira mais leve de ser. Um exercício difícil, é verdade, desafiador, mas com resultados provavelmente bons.
O dia mal começou e ainda tenho alguns quilômetros a percorrer. Mesmo acostumado com exercícios, sinto cansaço. Mas uma certeza toma conta de mim: algo novo e diferente de tudo está começando. Esqueço de me sentir cansado e tenho uma imensa vontade de ver o pôr-do-sol. Estranho? Nem tento entender o motivo. Acho que quero o fim da festa, o efetivo recomeço. Seremos iguais ao que sempre fomos se não encararmos uma renovação individual, interna, real e eterna. É a nossa chance. Mesmo que tudo não tenha passado de um erro de cálculo dos cientistas.
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