Desde que voltei ao Rio, visitei quase todos os lugares que gostava e que costumava frequentar quando morava aqui. Muitos sofreram grandes mudanças e ainda não consegui ver, por exemplo, o novo Maracanã; outros tantos se degradaram: o Largo do Boticário está entregue ao deus-dará. Uns poucos melhoraram; não fui à feira de São Cristóvão, mas tenho amigos que adoram. No final das contas, pouquíssimos se conservaram como nas minhas lembranças. Esses me fizeram voltar no tempo e sentir saudade da juventude e adolescência.
Um deles é especial para mim. Pode parecer estranho, pois não se trata de um local pequeno e aconchegante, mas algo de grandioso e vital para a cidade. É a avenida Rio Branco. Na adolescência, caminhava diariamente em suas calçadas e achava o máximo admirar seus prédios antigos, alguns da década de 1930, outros herdados dos tempos em que o Rio era a capital do país. Mas o que mais gosto é do fato da avenida fazer uma ligação do mar ao mar.
Quando entrei para o ginásio, passei a ir de ônibus para o São Bento e percorria a pé o trecho até a Presidente Vargas no final do dia. Às vezes, prolongava o trajeto até quase a altura da Sete de Setembro, onde passava outro ônibus que vinha mais vazio.
Conheço cada prédio e me lembro das lojas que ali existiam havia trinta anos e comparo com hoje. Muita coisa se manteve. É claro que boa parte do comércio se foi, mas o calçamento largo, as árvores que fazem sombra e o vento que circula pelo corredor de construções que tem o mar nas duas pontas trazem lembranças muito boas. O traçado da avenida Central, de mar a mar, foi deliberado, pois ao chegar no porto, na Praça Mauá e partir em direção à zona sul, era preciso passara pelo cais da praça 15, bem feio no início do século XX. Pela nova via, o visitante percorria algo inspirado num bulevar parisiense e encontrava construções altivas e elegantes.
Eu me achava muito crescido aos treze anos, andando por ali de uniforme do colégio, sem ter a mínima noção do que eram alguns daqueles prédios enormes e antigos. Era fascinado pelo Edifício Avenida Central por dois motivos. Em primeiro lugar, porque havia uma loja de aeromodelismo e aviões para montar chamada Hobbylandia, onde meu irmão, nossos amigos e eu comprávamos modelos da II Guerra Mundial para montar e pintar, era uma mania entre nós. No mesmo andar, tinha uma parte do Bob’s que servia na frigideira ham and eggs com torrada e eu adorava. Era uma área que só abria na hora do almoço. Desde que voltei, o edifício foi minha única decepção na avenida, pois está tomado por lojas e quiosques que vendem softwares piratas, computadores chin-gui-lin e todo o tipo de serviços de desbloqueio e conserto de celulares, laptops e tablets. Mas é pouco diante da grandeza da antiga Casa da Moeda, na esquina da Visconde Inhaúma; da atual sede da Agência Nacional do Petróleo, na esquina da Presidente Vargas; do prédio escondido, mas o único com sacada na sobreloja, da Associação Comercial do Rio de Janeiro, perto da Rua do Ouvidor; do Edifício Marques do Herval, que abrigava no subsolo a livraria Leonardo da Vinci, frequentada por toda a intelectualidade carioca nos anos 1960 e 1970, sem falar de marcos famosíssimos como o Museu Nacional de Belas Artes, a Biblioteca Nacional e, por fim, o Teatro Municipal, lindamente restaurado. Na verdade, a Cinelândia melhorou muito. Seus prédios estão com ótima aparência e certamente a presença da Câmara dos Vereadores ali ao lado ajudou bastante na conservação do local. Poucos prédios são tão bonitos quanto o do Cine Odeon.
Quando comecei a trabalhar e o metrô havia sido recém-inaugurado no Centro, vinha da Central do Brasil para a Avenida Rio Branco na hora do almoço, ora num dos n Rei, Príncipe ou Embaixador dos Galetos, ou mesmo para um belo Big Mac do também recém-chegado McDonald’s da Rua São José.
Até hoje quando ando por esta parte do centro, tenho imensa sensação de liberdade, mesmo quando percebo que a avenida não é tão longa quanto eu acreditava que fosse e que os edifícios são até baixos, quando comparados com outros em cidades tão grandes quanto o Rio. Para mim, guardam a imensa saudade das vezes em que andei por ali com colegas, com meu irmão, com meu pai ou minha mãe quando íamos ao dentista e ao médico. Naqueles tempos, tudo acontecia no centro!