Depois de uma semifinal tensa com a Holanda, ganha nos pênaltis, que assisti num hotel em Milão, mal podia acreditar que os ingressos que ganhei cinco meses antes seriam para uma final de Copa com o Brasil, na tentativa de ganhar o penta, em 1998. Gritei tanto que cheguei a receber uma ligação da recepção para que eu moderasse o tom de voz. Minha mulher, morrendo de vergonha alheia, me deu uma bela bronca.
Tudo começou durante um happy hour como tantos, numa quinta-feira calorenta de fevereiro, sem vento, no verão paulistano. Com gravata afrouxada, botão do colarinho desabotoado, e bebendo antes de tudo uma água com gás com gelo, esperava alguns amigos após um dia de reuniões e consultas com advogados sobre a venda de uma participação em uma importante usina siderúrgica. Estava cansado, mas satisfeito. Tudo havia terminado bem. E principalmente: acabara o período mais tenso de negociações sigilosas. A partir daquele dia, tudo seria feito às claras.
O primeiro amigo a chegar reparou no meu ar de cansaço e disparou:
— Vamos logo beber alguma coisa mais forte para te animar.
Ao explicar o motivo do cansaço, reparei que ele não tirava os olhos de mim e não conseguia tampouco fechar a boca. Quando terminei, ele me perguntou se a informação que eu passava era real, segura e sigilosa. Respondi afirmativamente. Mas esclareci que o sigilo que havia terminado.
Quando os outros dois amigos chegaram, o primeiro pediu licença para se retirar e saiu, me fazendo muitos agradecimentos. Não entendi e passei a conversar com os outros e a beber algo mais forte.
Na semana seguinte, meu amigo convidou a mim e a minha mulher para um jantar, dizendo:
— Preciso retribuir o favor que me fez.
Sem entender nada, fomos para o restaurante. Ele me explicou que tinha negócios interligados a minha operação e em função da informação que obtivera, ele pôde se precaver em relação a possíveis mudanças que o novo dono da usina siderúrgica talvez quisesse implementar. Depois da explicação, ele emendou:
— Com isso, meu chefe francês mandou te dar esse presente.
Entregou-me um envelope. Fiquei sem graça e preocupado com o que seria o conteúdo. Ao abrir, vi que eram dois ingressos para a final da Copa de 1998. Perdi a fala. Um apaixonado de futebol na final de uma Copa do Mundo. Fiquei com olhos cheios d’água e não encontrava palavras para agradecer. Eu não havia feito nada para merecer aquilo.
Meses depois, num domingo de sol do verão francês, não consegui almoçar tamanha a excitação. Tinha resolvido ir de camiseta amarela e um boné do Brasil. A campanha da Seleção da França era muito boa, mas estávamos confiantes.
Informei-me antecipadamente sobre a localização de nossos assentos e partimos num taxi para o estádio com quatro horas de antecedência. Eu queria ver tudo!
Percebi o quanto era distante o famoso Stade de France, e também como estava tranquilo o trânsito. O motorista do taxi era marroquino e torceria para a França, mas deixou claro que se a equipe perdesse, ele não ficaria assim tão chateado.
Eu estava acostumado aos estádios daqui e ao chegar e perceber que não havia filas nem tumulto para entrar e que os guardas pediam “por favor” e “com licença” antes de passar o detector de metais, me dei conta que era mesmo a final de uma Copa do Mundo. Sim, faltava certo calor de jogo, o barulho dos bumbos, mas para eu que queria admirar o espetáculo estava perfeito.
Minha estupefação durou pouco, aliás, passou a ser outra. Escutei outros brasileiros falando do problema que acometera Ronaldo Fenômeno. A falta de mais informações era muito ruim e depois de sermos conduzidos aos nossos lugares, tal qual fosse um teatro, por um rechonchudo e simpático alemão, procurei em volta por algum brasileiro, atrás de mais notícias.
Quando o time do Brasil foi confirmado pelo placar eletrônico fiquei mais tranquilo, mas sabia que algo não ia bem, muito mais pelo pouco barulho de nossa torcida do que por qualquer outra coisa.
A emoção de estar em uma final de Copa do Mundo voltou com toda a força com a execução do nosso hino, seguido pela Marselhesa, entoada por todo o estádio.
Festa espetacular, tudo perfeito, e paro por aqui.
O resultado é conhecido.
Assisti até o fim às comemorações do time francês, campeão de forma merecida, à festa bonita com torcedores chorando como crianças se abraçando e me cumprimentando de maneira respeitosa e amigável.
Não foi o resultado que eu queria, mas foi um espetáculo para nunca mais ser esquecido.