Por onde andavam as meninas? Não sei. Eu jogava bola e não reparava. Até que num belo dia comecei a notar os cabelos soltos, os olhos, os sorrisos disfarçados e sua timidez. Foi mais ou menos ali no verão de 1974. Começaram os risinhos em direção à nossa roda de conversa na praia e aqueles recados transmitidos pelas amigas. Aos poucos, as rodas foram ficando mistas. Em qualquer grupo, há sempre um que é mais saidinho. Acho que fui eu. Pensando bem, lembro agora que costumava bater mais papo com elas. Minha prima teve certa influência. Era um elo de ligação entre as duas rodas; eu de um lado e ela do outro.
É engraçado como tudo costuma acontecer nos verões, no Rio. Parece que o corpo é descoberto mais cedo, em todos os sentidos.
Foi nesse tempo que começou minha atração pelos olhos femininos, não sei bem com que idade. Minha primeira namorada tinha imensos olhos verdes e era loura, uma exceção a uma regra que eu seguiria mais tarde. Não vou dizer que deixei o futebol, as brincadeiras de polícia-ladrão que se valiam de praticamente de todo o bairro. Mas as meninas passaram a ocupar um novo espaço.
Fui o primeiro na turma a arranjar uma namorada. Era complicado ficar com ela e perder o futebol. Mas eu não gostava de namorar na frente de todos. Foi uma fase de descobertas, de constatação de diferenças nunca antes percebidas. Tempo das primeiras músicas ouvidas com alguém especial, de dividir afinidades, das dúvidas dos beijos e abraços, consentidos e assustados, de ficar de mãos dadas até que elas ficassem molhadas de suor.
Percebi coisas de que não me esqueço até hoje, como a espantosa maciez das mãos femininas e de como é delicioso o toque em seus cabelos. E também aquela maneira de nunca dizer explicitamente sim ou não e deixar tudo nas entrelinhas. Coisa complicada na adolescência. Complicadíssima na vida adulta.
Foi nesse momento em que comecei a questionar minha permanência no São Bento e planejar a ida para o Colégio Andrews. Por que ficar num colégio só de homens? Por que continuar a sofrer com a tal da matemática moderna?
Depois daquele namoro, senti que uma transformação havia acontecido. Nas primeiras festas, vencida a timidez de dançar junto na frente de todos, descobri que tinha ganhado muitos pontos. Era mais respeitado na turma, reconhecido pelas meninas. Por dentro, também me sentia outro. Havia descoberto que, de alguma forma, elas eram iguais a nós, mas ao mesmo tempo, podiam ser muito diferentes, uma sensação que persiste até hoje. Nunca desistirei de tentar entendê-las
Definitivamente, aquele foi um verão de descobertas. O início de uma infindável admiração e inquietação provocadas por elas, as meninas.
Será que os jovens de hoje experimentam essas emoções? Andar de mãos dadas (até suar)? Ter coragem em desfilar em público com uma namorada (mesmo que de forma inocente) ou tudo agora é só “ficante”? Ótima reflexão do que fomos…e (quem sabe) nossos filhos não serão….Parabéns
Obrigado, as coisas mudaram tanto que nem sei mais nada. Sei que comigo foi bom e espero mesmo que com os nossos filhos também seja.