Aquilo roxo

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Já disse por aqui que não dirijo, mas sempre comprei os carros que tive enquanto casado. É claro que estive sujeito a erros, mas não cometi nenhum em relação à marca ou à qualidade dos veículos.

Era início dos anos 1990. Tinha recebido um belo bônus no final do ano e resolvi que, com a abertura comercial do país, estava na hora de comprar um carro importado. Estudei os preços e depois de uma semana parti para uma concessionária Volkswagen para comprar um Passat alemão, a primeira station wagon. Um nome pomposo para aquilo que anteriormente, no tempo das carroças nacionais, se convencionou chamar camionete.

Conversei de tudo com o vendedor: o preço, o possível financiamento (em doze meses, na época), leasing, os acessórios, data de entrega pois os carros  estavam no porto, o seguro (em combinação com a seguradora do carro anterior). Passei quase duas horas por lá. Finalmente vi que só tinha a cor: azul céu! Entrei em pânico. Mas era o único veículo disponível, pronto para chegar em São Paulo dentro de uma semana. Depois de mais meia hora discutindo se aquele era céu diurno ou noturno, saí de lá com a garantia de que era um tom mais escuro.

Aquela compra era para ser uma surpresa. Não dividi com ninguém as minhas dúvidas e fiquei à espera da chegada do carro.

Cheque da entrada compensado. Esperei por uma ligação, afinal não dava para acreditar totalmente naquela história de automóvel no porto. Recebi enfim um telefonema da concessionária. Fui para lá ao final do dia, já escurecendo. Seguiram-se mais discussões sobre acessórios, o famoso hack seria cobrado, o que reclamei. Afinal, num carro daqueles o item deveria vir de fábrica. Saí com essa pequena vitória, meio a contragosto, pois só pegaria o veículo no dia seguinte em função do seguro.

Sempre gostei de dar presentes. Por isso não consegui me controlar e soltei a novidade na hora do jantar, provocando muitas exclamações de alegria…

— Qual é a cor, amor?

— Azul céu!

— Sei…

— Mas é escuro…

No dia seguinte, uma quinta-feira, véspera de um feriado prolongado, o carro foi liberado ao meio-dia, horário perfeito para uma pequena viagem para sítio de amigos. Tudo certo, malas prontas, tralhas de criança pequena separadas, minha mulher foi buscar o automóvel.

— Você viu o carro?

— Ahn…não…

— Ok.

— Você gostou? É legal?

— É ótimo. Adorei…

O tom da voz, no telefone, não era assim tão esfuziante, mas não liguei muito e fui para casa.

Cheguei em casa com pressa para tomar banho, trocar de roupa e viajar. Minha filha mais velha, que aprendia inglês no microcolégio onde estudava, recebeu-me com a seguinte frase:

— Papai, o carro é bonito! É purrrrple.

Ela caprichou no r carioca, como costumava escutar em casa.

Olhei para a mãe, incrédulo, e antes que eu conseguisse proferir uma palavra, ela falou:

— O carro é ótimo. Da próxima vez, você compra um preto.

E caímos na gargalhada. Desde então, sempre pedíamos a minha filha para repetir a cor do carro:

Purrrrple, papai…

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