Ainda existem botecos onde o preço da cerveja não assusta e permite aquelas conversas sem pressa entre amigos, enquanto o trânsito melhora depois de mais um dia de trabalho chato.
— Cara, como vai ser na Copa?
— Como assim?
— Como assim!? Não tem nada pronto na cidade, vai ficar um caos o trânsito, os preços subirão tanto que nem isoporzinho resolve.
— E daí, pra quê tanto drama?
— Nos últimos três meses, a Prefeitura acabou com a Perimetral, fechou o mergulhão da Praça XV e botou mão dupla na avenida Rio Branco. Não podemos mais nem sacanear os paulistas. O trânsito daqui está igual ao de lá. Acho que vou tirar um mês de férias.
— Aluga seu apartamento e ganha algum, se está tão estressado.
— E você não está preocupado?
— Não. Não é problema meu!
— Como não é? É a sua cidade que estão destruindo sei lá para quê!
— Ok. Minha cidade. Um mês. Moro aqui há quarenta anos. Já tivemos outros períodos de caos e sobrevivemos.
— É isso que falo! Será sempre assim, um caos, e temos que achar normal porque passa e sobrevivemos?
— É assim, sim.
— Está bem. E o roubo das vigas da Perimetral? E o custo da obra do Maracanã? É o seu dinheiro!
— Meu? Meu não, eu sonego tudo que posso. Na padaria não tem nota fiscal, nem no mercadinho, na feira, no posto de gasolina, na banca de jornal, no boteco. E nunca peço recibo no médico ou no dentista.
— E você acha isso certo?
— Não sei se é ou não é. Aliás, estou sem vontade de querer saber.
— Mas como você acha que as coisas vão melhorar, pensando assim?
— Prá mim, está tudo ótimo do jeito que está. O futuro, os outros que façam e ainda paguem a dívida.
— E se a maioria for como você?
— Não me preocupo. Sempre haverá uma minoria como você, que faz tudo, enquanto a gente aproveita mais a vida. Falando nisso, vou pedir mais uma cerveja porque você falou tanto que essa daí esquentou. Dá agora para falar de mulher e do gol que não deram pro Vasco? A juizada se borra de medo do Flamengo!