Dom de iludir

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Cambio I

Um dos assuntos mais importantes quando se mede a credibilidade de um país em termos econômicos é o seu Balanço de Pagamentos. Por envolver muitos números e consequentemente notícias, acaba por equivocar quem confunde o preço da moeda local em relação ao dólar com a saúde econômica de um país. Vou tentar esclarecer e analisar a atual situação do Brasil, confortável no curto prazo, porém mais preocupante do que há cinco anos e também quanto ao longo prazo.

O Balanço de Pagamentos é composto por dois grupos de contas: Transações Correntes e Conta de Capitais. Nas Transações Correntes estão os assuntos mais noticiados pela imprensa. Elas são compostas por:

  • Balança Comercial (exportações-importações);
  • Balança de Serviços (transportes+fretes+seguros+viagens internacionais+despesas de governo+juros da dívida externa estatal+remessas de dividendos+lucros+juros+royalties);
  • Unilaterais

Nesse grupo, quase todas as contas têm importância. A Balança Comercial reflete qual o comportamento do país em relação aos excedentes e às suas necessidades. O Brasil ainda é um país de forte exportação de matérias-primas, sejam agrícolas ou minerais, e também é forte na importação de manufaturados, máquinas e tecnologia. Logo é importante que o preço das chamadas commodities esteja alto para compensar o que importamos. A situação desde 2010 não está tão favorável, e assim vemos uma redução gradativa da Balança Comercial. Neste ponto, não só o Brasil, mas todos os governos procuram “direcionar” suas moedas para melhorar suas vendas e até dificultar compras externas, pois no Balanço de Pagamentos, esse item é um dos mais importantes. Uma moeda dita “fraca” em relação ao dólar, como o iene, é resultado de uma estratégia comercial e não guarda relação com a credibilidade ou potência da economia do país.

A Balança de Serviços engloba todos os custos para exportar e importar (transportes+fretes+seguros), já que quase todo o comércio é feito por frota internacional. Traz também o sustento de todas as embaixadas e representações do Brasil, bem como bolsas de estudo pagas e ainda juros de empréstimos de empresas estatais (despesas de governo+juros da dívida externa estatal).

Nos últimos seis anos, os gastos dos brasileiros em viagem ao exterior e as despesas dos estrangeiros no país passaram a suscitar intensos debates. Era até então uma conta sem muita importância, pela dificuldade do crédito para a compra das passagens e pelo dólar caro. No entanto, com o crédito parcelado para viagens e a diferença imensa entre o preço dos produtos no Brasil e no exterior,  os brasileiros passaram a dispender cinco ou seis vezes mais  do que os estrangeiros deixam por aqui. A análise direta é sobre a enorme carga tributária que temos e o atual preço elevado do turismo interno, desencorajando turistas a gastar ou ficar mais tempo no Brasil. Convenhamos que o país poderia e deveria ter um turismo com participação relevante no PIB, o que não acontece.

Cambio V

Finalmente neste grupo, temos as remessas de empresas (remessas de dividendos+lucros+juros+royalties) que se instalaram no Brasil. Esta é uma via de mão dupla, como veremos adiante. Se uma empresa resolve ter uma unidade no Brasil, calcula-se que haja após um período médio de cinco anos uma remessa de aproximadamente 5% do valor investido ao ano, o que leva a conclusão que o país precisa sempre atrair investimentos, além de dar condições de reinvestimento.

O ítem Unilaterais é composto por envios e recebimentos não constantes, onde figuram por exemplo remessas de recursos de brasileiros no exterior e estrangeiros no Brasil, mas não é  um ponto importante no momento. No passado, nas décadas de 1970 e 1980 com forte emigração para o Japão e dólar escasso no Brasil, essas remessas foram relevantes. Hoje não mais. Temos no exterior muitos brasileiros, mas o país também absorveu grande número de estrangeiros.

O saldo das Transações Correntes é fundamental para o Brasil, pois sempre fomos grandes exportadores, e se a Balança Comercial começa a ter saldos baixos ou insuficientes para a compensação de outras despesas em moeda estrangeira, aí sim começamos a perder credibilidade. Começa a haver questionamentos sobre o que leva o saldo da Balança Comercial a andar tão ruim. E se haverá queda das reservas internacionais para sustentar um resultado negativo nas Transações Correntes.

Na Conta de Capitais se encontra toda a movimentações financeira feita entre empresas e governo brasileiro com os demais países e empresas ao redor do mundo: empréstimos, financiamentos, investimentos e amortizações.

A partir de meados da década de 1990 com a abertura comercial do país e depois com o Programa de Privatização e o sistema de dólar flutuante, a conta de capitais que pouco contribuía para o Balanço de Pagamentos, começou a até “financiar” as Transações Correntes, pois o Brasil começou a receber importante volume de investimentos externos e empréstimos a empresas brasileiras e estrangeiras, a maioria de longo prazo, melhorando a credibilidade do país, aumentando as reservas internacionais e impulsionando a produção de bens semimanufaturados e manufaturados.

De forma resumida está aí a explicação das ferramentas que um governo possui para fazer sua política cambial. Se privilegia as exportações com moeda mais fraca, se incentiva o turismo com menos impostos, se incentiva a entrada de investimentos com menos burocracia e se condensa tudo em um pacote de melhor infraestrutura. Mas como mencionado anteriormente, sempre sem perder de vista o envio de lucros, juros e dividendos.

Vê-se que o país atualmente está de alguma forma perdido. A Balança Comercial cai, as despesas com viagens internacionais batem recordes mensais, a péssima infraestrutura nos faz perder exportações e aumentar gastos com fretes, transportes e seguros, e por enquanto os investimentos e empréstimos conseguem conter esta sangria. Até quando? Para uma simples comparação, o saldo da Balança Comercial foi de 25,3 bilhões de dólares em 2009 e está projetado para cinco bilhões em 2013. O saldo das viagens internacionais, antes pouco representativo, em 2009 foi negativo em 5,5 bilhões de dólares e este ano deve chegar a 22 bilhões negativos.

As Transações Correntes, primeiro grande grupo de contas que forma o Balanço de Pagamentos, fechou 2009 no vermelho, em 24,3 bilhões de dólares e este ano deve chegar a 70 bilhões no negativo.

Os Investimento Estrangeiros Diretos que vêm sustentando estes gastos em 2009 foram de 25,9 bilhões de dólares. Este ano, calcula-se que ficarão em 60 bilhões, em queda de 10% em relação a 2012.

O Balanço de Pagamentos que em 2009 foi positivo em 46,6 bilhões de dólares, representando 1,7% do PIB, em 2012 foi 0,8%, poderá encerrar este ano no negativo.

Isso não é o fim do mundo, com certeza. No entanto, os sinais não são bons. O voo de galinha está aí. Teremos que ter cuidado, pois a credibilidade está sendo abalada em todas as frentes. Inflação acima da meta, persistindo no “cheque especial”, contas públicas fechando com “contabilidade criativa” e contas externas piorando ano a ano.

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