Estreia nas urnas

0 Flares Twitter 0 Facebook 0 Google+ 0 LinkedIn 0 Email -- 0 Flares ×

1º Turno II

No ano do vestibular, quando voltava do colégio, normalmente eu chegava em casa sem muita vontade de conversar. Escutava o que os outros tinham a dizer e só perguntava pelo almoço. Mas naquele dia, em cima de minha cama encontrei algo de diferente. Um telegrama. Quando comecei a abrir, minha mãe já estava posicionada na soleira da porta. Eu havia sido convocado para ser mesário na eleição de 1978, que escolheria deputados estaduais, federais e senadores.

Naquela época, não havia muitas desculpas para escapar dessas convocações. Assim, no dia 15 de novembro, lá estava eu, às 7h30, na porta da seção, no Instituto Benjamin Constant. O presidente da mesa era um vizinho de bairro que me saudou efusivamente. Tinha um espírito cívico enorme. Aos 19 anos, o meu era inexistente. Obedecia ordens para arrumar o cenário a fim de receber os primeiros eleitores, pois já havia fila minutos antes do início da votação, às 8h.

Ajudei senhoras e senhores a subirem escada. Passei grávidas, idosos e médicos de plantão na frente dos outros. Recolhi santinhos deixados na cabine, na realidade uma estrutura de papelão enorme para garantir a privacidade do eleitor. Enfim, funcionei como uma espécie de faz-tudo. Recebia cumprimentos de pais de amigos, biscoitos e bolinhos de senhoras também com espírito cívico, e ainda fui muito sacaneado pelos amigos, todos do bairro. Estava indo bem e então fui chamado para auxiliar os deficientes visuais em sua seção eleitoral específica. Trabalhei muito. Fiquei satisfeito. Faltando uma hora para terminar o horário, voltei para a minha seção e recebi elogios do meu “general civil”. Ele disse que me recomendaria para as próximas eleições. Achei realmente que ele estava de brincadeira.

1º Turno I

 

Passaram-se quatro anos. Em 1982, recebo um novo e fatídico telegrama. Quase fui na casa do vizinho tomar satisfações. No dia seguinte recebi mais uma correspondência, uma carta, dizendo que deveria fazer um “treinamento”. Depois de quase vinte anos, além de parlamentares, voltaríamos a eleger governadores. Além disso, acabara o bipartidarismo que durou entre 1965 e 1979.

Ao chegar para o treinamento descobri que eu seria presidente de mesa. A raiva pelo vizinho aumentou mais ainda. Recebi cartilha, instruções e determinações. A atuação dos fiscais de partido foi maior e várias vezes fui chamado para resolver pequenas pendengas entre eles. Ao final, lacrar a urna, esperar a joaninha (o fusca utilizado pela PM) para acompanhar a urna até o ginásio do Mourisco (onde hoje existe um prédio), na entrada do túnel do Pasmado, e esperar ser recebido pelos escrutinadores. Cheguei em casa às 22h. Ganhei dois dias de folga pelo dever cívico.

Nas eleições de 1986, novamente convocado, eu já morava em São Paulo, e mandei uma carta ao Juiz Eleitoral pedindo dispensa, no que fui atendido.

Diante de toda essa experiência pregressa afirmo que quem disser que não gosta de eleições está mentindo. Se bem que existe mesmo gente que não gosta de processos democráticos. Não sou muito de usar frases feitas como chamar o pleito de “festa da democracia”, mas acho animadíssimo o dia da votação.

Apesar das campanhas por aqui a cada ano baterem novos recordes de mentiras, calúnias, inverdades e serem eleições para definir quem é o melhor “marqueteiro”, e não o candidato, essas eleições de 2014 foram um enorme deserto de ideias e propostas.

Sem saudosismo, e somente constatando, alguém consegue comparar os debates entre os candidatos ao governo do estado do Rio de Janeiro de 1982, com Leonel Brizola, Moreira Franco, Sandra Cavalcanti, Miro Teixeira e Lysâneas Maciel, com aqueles protagonizados por Pezão, Garotinho, Crivela e Lindberg Farias? E para senador a discrepância é ainda pior. Em 1982, tínhamos Saturnino Braga, Artur da Távola, Rafael de Almeida Magalhães, Celio Borja e Wladimir Palmeira. Em 2014, as opções foram Cesar Maia, Romário e Carlos Luppi

No passado, debatia-se nos bares, nas casas, no trabalho, enfim em qualquer lugar, cara a cara. Hoje em dia, as discussões foram multiplicados a enésima potência pelas redes sociais, com pessoas fazendo campanha, enviando mensagens, tecendo considerações, se tornando até raivosas com quem discorda. Foi preciso muita paciência para não perder amigos ou brigar com familiares. Mas tudo isso faz parte do jogo.

O resultado agora é detalhe. Que venha o segundo turno. Bom mesmo é termos vivenciado mais uma eleição. Vou torcer para que o vencedor, mesmo que não seja do meu agrado tenha um bom discernimento sobre as decisões, pois os próximos anos não serão nada fáceis.

0 Flares Twitter 0 Facebook 0 Google+ 0 LinkedIn 0 Email -- 0 Flares ×

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *