Por coincidência encontraram-se no shopping. Ele acabara de comprar sua nova raquete para a partida de tênis semanal. Ela procurara sem encontrar um vestido para a formatura da filha mais velha. Não se viam havia quase oito anos, desde a época em que seus respectivos casamentos acabaram, com poucos meses de diferença. Ele tinha sido casado com uma professora universitária amiga dela desde o colégio até a profissão; ela, com um pernóstico professor e físico nuclear.Os dois casais saíram juntos várias vezes, tornaram-se amigos. Na verdade, apesar de se respeitarem, os homens não se suportavam. Tinham em comum apenas a torcida pelo mesmo time de futebol, o combalido Botafogo. Fora isso, mantinham relações cordiais apenas por causa da amizade entre suas esposas.
Da conversa rápida no corredor do shopping surgiu um convite para um café, por iniciativa dele, convite aceito na hora. Conversaram sobre o que haviam feito nos últimos anos, dos sucessos e fracassos profissionais, das dificuldades de relacionamentos com os ex, dos feitos dos filhos e dos seus atuais momentos pessoais.
A hora correu mais rápido que os relógios de ambos. Despediram-se e prometeram encontros posteriores, coisa que ele acreditava que não aconteceria, apesar de concordar com entusiasmo. Trocaram telefones.
Já na saída do shopping, chegou-lhe uma agradecendo o café, elogiando a conversa e afirmando que ela esperava por novo convite. Entre educado e assustado, ele respondeu que realmente tinha sido ótimo e que o convite não tardaria. Pensou a questão estivesse encerrada naquele momento.
No dia seguinte, na hora do almoço, chegou uma nova mensagem. Um convite para tomar vinho na casa dela, na noite seguinte. Ele aceitou e se arrependeu.
Chegou com flores e foi recebido com um sorriso bonito e um perfume que chamou sua atenção. Foram para a sala onde a luz era indireta, a decoração sóbria. Ao fundo ouviu uma música tocar.
– Pensei que o Augusto é que gostasse de fado?
– Não, na verdade acho que ele só gosta dele e do espelho dele.
Riram e ela o serviu de um vinho italiano que ele gostava.
– Acertei no Brunello?
– Sim. Um brinde ao reencontro.
– Bom brinde esse…
Apesar de recear o rumo que aquele encontro poderia tomar, ele foi se deixando embalar pelo vinho, pelas mãos que se tocavam às vezes, pelos braços que se roçavam quando se ajudavam a servir o vinho. Ela o olhava sempre sorridente. Ele percebeu que retribuía com um olhar diferente do dia em que se encontraram.
Desacostumados com essa esgrima de olhares, risos, frases soltas, pequenas lembranças que só eles entendiam, foram percebendo aos poucos que a tensão havia subido no ar. Alguém teria que dar o próximo passo. Era uma amizade boa para estragar com uma noite mal interpretada: esse pensamento não saía da cabeça dele. Mas os dois pareciam querer correr o risco.
Ela se levantou e foi até a janela da sala com vista para o morro próximo ao Corte de Cantagalo e comentou que noite estava escura, sem lua. Sem pestanejar ele a seguiu e retrucou que era lua nova. Chegou tão perto dela que além daquele perfume que o deixava meio hipnotizado, escutava também a respiração dela, que se acelerava, percebeu a voz falhar quando perguntou se lembrava como haviam se conhecido. Ele não respondeu. Passou devagar a mão no braço dela, percebendo que o arrepio na pele. Ergueu o rosto e viu seus olhos a poucos centímetros dos seus. O hálito dos dois era o mesmo, não havia nenhuma resistência dela. Eles se beijaram. Começou a ventar de leve. Sabe-se lá quanto tempo depois, as bocas se separaram e os dois voltaram a se olhar.
O silêncio era o mais provocante possível. Ele sorriu de leve, enquanto ela abaixou a cabeça ligeiramente, sem deixar de fazer carinho nas costas dele. Quando voltaram a se abraçar, ela falou baixinho ao seu ouvido:
– Fica aqui. Tem mais vinho, mais beijo, mais noite escura e tudo mais que quisermos.
– Se só tivesse o seu perfume, eu já ficaria.