Chove chuva

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Chove I

Como todo bom carioca, defendo que, por aqui, não deve haver mais do que três dias chuvosos seguidos, pois a cidade ganha ares tristes.  Mas devo confessar que ando com saudade da chuva, da paisagem nublada que aprendi a achar bonita também. Tudo anda tão seco! Depois de viver 28 anos em São Paulo, aprendi a apreciar os períodos “molhados”.

Precisamos de chuva!

Gosto de manhãs cinzentas para tomar um café quente e forte, comer uma torrada com manteiga derretendo enquanto leio jornal e escuto os pingos caindo nas árvores, em ritmo de moderado a forte. Dá para pensar na vida, nos problemas da humanidade e até voltar a dormir, uma vez que é mesmo impossível resolvê-los.

Gosto das tardes cinzentas, mais longas,  que permitem um almoço mais consistente com a desculpa de que está até um pouco frio. Serve de pretexto para uma sobremesa mais doce e, olha ele aí de novo, outro café forte e quente, mas desta vez um pouco menor.

Pode-se ficar observando algum tempo a chuva caindo na janela e fazer até uma corrida imaginária de pingos escorrendo pelo vidro, o que lembra minha infância quando qualquer competição servia para que eu aprimorasse meus dotes de locutor e comentarista de qualquer esporte que pudesse ser concebido.

E pode aparecer uma sonolência, um soninho guardado especialmente para essas ocasiões.  Coisa de pouco mais de uma hora. Tempo suficiente para acordar e perder a noção de tempo e lugar. Há quem prefira assistir a um filme. Nada inédito, algo que já se tenha visto umas duas ou três vezes, que se saiba alguns diálogos, que se sorria e se chore sempre na mesma hora. Nada que exija entendimento superior a cinco minutos para saber como será o final. Isso é sempre um divertimento perfeito para acompanhar a chuva fraca que teima em não parar.

Uma passada na janela,ver as folhas na árvore próxima pesarem a cada par de minutos pela água acumulada e agradecer ao Criador pela preguiça sem culpa desses dias.

Então, se preparar para o anoitecer sem saber mesmo a hora exata que ele acontece, porque todas as horas tiveram a mesma tonalidade de cinza, mas a chuva cai cada vez mais fina e preguiçosa, avisando que deu essa chance de deixar o tempo passar e sentir a umidade no ar, mas que no dia seguinte ela vai deixar o sol vir com força de novo.Aprendi a me renovar nesses dias que convidam à introspecção.

De volta ao presente: o fato é que não chove no Rio de Janeiro dessa maneira há algumas semanas e minhas forças vão se acabando tal qual Super Homem perto de criptonita. Preciso de um dia quieto com livros, filmes, café e chuva na janela.

Tenho que agradecer a São Paulo por ter me ensinado a apreciar esses dias.

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