Tímido mas seguro

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Sou_tímido_I

Cheguei em São Paulo para trabalhar com 25 anos, o objetivo era começar um departamento novo em uma instituição financeira. Com o crescimento desta, foi estabelecida uma reunião diária para que se formasse um consenso sobre os acontecimentos e assim falar com os clientes, conforme o noticiário do dia. À mesa, participavam catorze pessoas. Durante três meses, fui mero ouvinte, sendo poucas vezes chamado a dar opinião. Certa noite, recebi uma ligação inesperada de um dos diretores: a partir do dia seguinte eu estava encarregado de conduzir a reunião. Não questionei. Senti suor nas mãos e arrepios na espinha. Aquele seria um desafio e tanto para alguém tão tímido quanto eu. Durante seis anos comandei diariamente a tal reunião. Sabia o que fazia e como se fazia. Na minha cabeça, timidez nunca foi sinônimo de insegurança.

Sou tímido. Isto quer dizer que prefiro observar mais, interagir menos e me expor quase nunca. Mesmo assim, em nenhum momento deixei de fazer algo, esquivei-me ao ser chamado ou fugi dos compromissos. Meu comportamento mais reservado vem desde pequeno, aliás, desde menor. Na escola, esperava que o professor dirigisse a pergunta para mim, evitando responder quando não era chamado, mesmo quando sabia o que dizer. Não pensava em dar uma chance ao colega. Na verdade, evitava me expor e ficava feliz por dentro ao constatar que sabia a resposta certa. Na faculdade, onde muitas matérias são comuns a vários cursos, não acreditava em trabalho em grupo e sempre pedia para fazer os projetos sozinho, por mais penoso que fosse. Podia até parecer soberba, mas eu me sentia pouco à vontade com desconhecidos.

Situações em que outras pessoas sofrem com tombos, gafes ou micos em geral costumam me deixar tenso. Para um tímido, tudo é muito constrangedor. Não se sabe o que é menos pior: ajudar quem sofre o embaraço ou correr o risco de chamar atenção sobre si. Hoje em dia, usa-se com frequência a expressão “sentir vergonha alheia”. Eu diria que esse é o sentimento do tímido DEPOIS do ocorrido. No momento embaraçoso, tudo que ele deseja é sair correndo do local. Aqueles que alegam sentir a tal vergonha alheia enquanto testemunham o fato não são os tímidos verdadeiros. Na maior parte dos casos, estão fazendo gênero. Também não se deve confundir timidez com o sentimento de vergonha, que é uma reação de cada pessoa ao que contraria seus valores.

Costuma-se dizer que todo o tímido é observador. Não é verdade. Alguns às vezes passam tempo demais entretidos com seus próprios pensamentos. Mas para mim, observar é uma forma de participar de tudo sem estar necessariamente envolvido, como se eu olhasse de dentro sem ser percebido. Sou capaz de participar de diversas situações sem que ninguém note a minha presença e, ao contrário do que ocorre nas situações embaraçosas, a felicidade dos outros me deixa feliz.

As dificuldades dos tímidos no trabalho e nos relacionamentos, os obstáculos que enfrentam para o crescimento profissional e o sucesso já serviram de tema para livros, reportagens, depoimentos, análises, todos com as mais diversas conclusões. Depois de muita leitura, cheguei à conclusão totalmente pessoal que muita gente confunde timidez com insegurança. Dizem também que os tímidos sofrem muito na vida. Todo mundo sofre na vida. Como disse, enfrentei e sei que voltarei a enfrentar situações em que minha timidez será uma barreira ou será posta à prova. Mas também sei que não deixo de fazer aquilo que realmente quero, gosto ou preciso. Aprendi a conviver com minha forma particular de lidar com momentos de constrangimento e nervosismo. E afinal de contas, quem é capaz de passar pela vida sem encarar momentos de “saia justa”?

 

 

 

 

 

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