Muito além do Leme e do Pontal

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Lazer Carioca I

Voltei ao Rio de Janeiro depois de 28 anos em São Paulo e vi que em matéria de lazer o carioca é um falso privilegiado. Desde então, a população dobrou e as praias ficaram imundas. Essa opção tradicional, celebrada em músicas e mostrado pelas novelas do Manoel Carlos está cada vez mais difícil. Pelo que me falaram os velhos amigos, as únicas novidades no cenário são o Parque de Madureira, e para espanto dos mais tradicionalistas, os shoppings!

Uma reportagem da Veja Rio em 2013 aponta que o lazer preferido para 56% da população da cidade é passear no shopping. Não é à toa que é justamente na Zona Oeste, área em que a cidade mais cresce, que se encontra a maior concentração de centros comerciais para todas as classes sociais.

Lazer Carioca III

Por força do trabalho viajei por todo Brasil e cada vez que dizia que era carioca sempre escutava exclamações de meus interlocutores. Havia suspiros, inveja, e os tradicionais comentários de que se morassem aqui não sairiam da praia. Como conseguíamos trabalhar passando diariamente em frente às praias? Tudo balela. Moro em um bairro considerado privilegiado, à beira da baía de Guanabara, ao pé do Pão de Açúcar e com vista para o Cristo Redentor. Na orla de 1.600 metros usada pelos moradores para se exercitar e pelos de fora para pescar e apreciar a vista existem três saídas de esgoto que despejam sujeira diretamente no mar.

E para a imensa maioria dos habitantes da cidade, a situação é ainda muito pior. O descaso dos governantes e a confiança no que a natureza proporciona punem os cariocas que vivem a mais de quatro quilômetros do litoral. Iniciativas como as do Parque de Madureira deveriam ser obrigatórias a cada três ou quatro anos, até para equilibrar o problema de trânsito da cidade, criando alternativas de lazer próximas a grandes concentrações de moradias. Acreditar que a praia basta como grande e único lazer dos cariocas é subestimá-los. Ao mesmo tempo, enfurná-los em shoppings, mesmo que voluntariamente, é um atentado à saúde física e financeira. Cabe à população da cidade cobrar mais iniciativas de lazer. Progressos na mobilidade urbana podem sem dúvida ajudar, mas não é uma solução oferecer opções que exigem que se transponham vinte ou trinta quilômetros em transporte público, mesmo que ele fosse de ótima qualidade. Além de sobrecarregar os orçamentos dos indivíduos, a necessidade de grandes deslocamentos reduz o tempo efetivamente destinado à diversão e ao descanso.

É importante que as áreas de grande concentração de moradias na zona norte da cidade tenham parques arborizados, limpos, com boa infraestrutura e segurança. Hoje em dia, as pessoas que passam mais tempo no trânsito caótico da cidade são justamente aquelas que dispõem de menos opções de lazer. Além do aspecto humano, é preciso lembrar que esses problemas potencializam o número de atendimentos de saúde, baixam a produtividade e geram insatisfação pessoal, ingredientes explosivos que combinados criam uma péssima qualidade de vida. Ao mesmo tempo, aqueles que costumam contar com mais opções para a diversão são os mesmos que perdem menos tempos nos deslocamentos do trânsito.

O resultado da equação é um fosso cada vez mais profundo separando as classes sociais. A intervenção do governo para reduzir essa diferença é prioritária e é um projeto que já está com uns trinta anos de atraso.

 

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