Como havia mais de um Luís na turma e no bairro, ele era o “Luís da Márcia”. E como com ela acontecia a mesma coisa, também ficou conhecida como a “Márcia do Luís”. Tinham quinze anos e haviam crescido juntos naquele bairro em que seus pais já moravam muitas décadas antes de terem nascido. Adolescentes, seus passeios nos finais de tarde eram acompanhados pelas senhoras que ficavam nos portões acompanhando o movimento, pelas crianças brincando na rua e pelos senhores que passeavam com seus cachorros. Logo se transformaram numa espécie de casal-símbolo do bairro. Algumas mães sonhavam com um namoro como aquele para as filhas; outras achavam aquilo tudo precoce demais.
Marcia se derretia quando recebia rosas cor de chá nas datas especiais; e Luis adorava que ela acompanhasse seus jogos de futebol. A turma não tinha dúvidas: tão bonitinhos e perfeitinhos, feitos um para o outro. O casamento era só uma questão de tempo. As mães dos dois se encontravam no bairro e trocavam segredos dos filhos, entremeados com risadas de quem tinha certeza de que seriam avós de muitos netos.
O tempo passava e eles cada vez mais juntos, descobrindo a vida e traçando planos. Às vezes, brincavam de passear de mãos dadas com “ninguém”, imaginando que entre eles estariam os filhos. Seriam dois, já estava decidido. Ela não gostava de ser filha única e ele achava dois o número ideal.
Um dia, ventava mais do que o normal. O cabelo liso de Márcia não parava no lugar e ela se irritava, um pouco mais inquieta que o normal. Numa virada de rosto, enquanto estavam sentados vendo o pôr do sol, ela declarou direto e reto:
— Quero terminar!
Quase quatro anos de namoro e apenas uma frase? Luís não entendeu, mas respondeu entre incrédulo e assustado:
— Assim do nada?
— Não é do nada. Não gosto mais de você. Acho que gosto de outro.
Totalmente sem ação, Luís não conseguia pensar, chorar nem falar. Assim caminharam juntos mais cinco minutos, mudos, sentindo um peso no ar, até a porta da casa dela.
Dias depois, sob os olhares atônitos dos amigos, Márcia apareceu acompanhada por outro namorado. A cada beijo dos dois, Luís sentia uma pontada na boca do estômago.
Nunca mais se falaram.
Agora, 33 anos depois, com a intermediação de amigos em comum, os dois se reencontraram no Facebook e chegaram a trocar rápidas mensagens. Ela viu todas as fotos dele, inclusive as das filhas. Duas, o número ideal.