Um brinde ao patrão

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Fim de Ano V

Conforme o fim do ano se aproxima, os departamentos administrativos, de pessoal, ou algum pobre coitado especialmente encarregado começam o planejamento das chamadas “festas de confraternização” das empresas,  um verdadeiro teste para se livrar da vergonha alheia e um fardo pesado para quem organiza. Já participei de algumas comissões de organização e garanto: é o inferno em vida.

O pesadelo começa com três perguntas fundamentais: Qual o orçamento? Em que dia da semana? Familiares serão convidados?

E aí, caríssimos, começam os (muitos) pitacos:

— Vê aí um lugar legal, o lucro tá alto!

— Na sexta-feira minha mulher não deixa!

– Na sexta-feira, só se eu puder levar meu marido!

– Pô, quebra essa Maurão, sem família! Tô de olho na ruivinha do Contas a Pagar.

— Ela é casada!

— Então ela vai sozinha e  eu também!

Não é fácil agradar a todos e ainda obter a benção da chefia às propostas apresentadas nos locais pesquisados.

— Mas precisa de bebida alcóolica?

— Não dá para ter festa com mate e água sem gás quente… desculpe chefia…

— E o que vai ter para comer?

— Tô fugindo do estrogonofe. Foi minha  única exigência para aceitar essa tarefa inglória.

Durante o período de escolhas e liberação de verbas aparecem as ideias “criativas”: apresentação de mágicos, karaokês, concurso de dança, o convite para chamar o amigo que canta “pra caramba, precisa ver…”

Decisões tomadas, define-se que haverá troca de presentes no esquema amigo secreto (afinal eu estava em São Paulo). A festa seria apenas para os funcionários, sem a presença dos familiares, o que agradou mais do que desagradou. Foi escolhido um restaurante com pista de dança e tudo o que poderia haver para uma festa legal. Afinal de contas, eu também queria me divertir. O único momento complicado seria a troca de presentes. Sou tímido demais para essas demonstrações públicas.

— Vai ter brinde? Sorteio do presente da empresa? O lucro tá alto!!

— O primo do amigo da minha tia disse que nesse lugar tem bebida batizada.

— A avó da cunhada do meu porteiro passou mal comendo nesse lugar.

— Tem hora pra acabar?

— Quem vai ser jijei? Tenho um amigo que é faz som lá no bairro!

Nunca fui tão assediado em um período tão curto. Nunca produzi tão pouco como nos vinte dias dedicados a cotações, ligações, recados, conversas de corredor e até algumas ameaças:

— Cara, a menina do almoxarifado vai comigo, mesmo que ela tenha uma queda por você…

— Quem te disse isso?

— A moça do café.

— Sai dessa, fofoca…

Chega o grande dia. Produtividade zero no escritório. Apenas  um assunto, conversas no café, grupo de mulheres indo ao banheiro juntas. Eu tinha certeza de que havia voltado ao Segundo Grau. Atendendo a pedidos, procurei a chefia para requisitar que o expediente se encerrasse uma hora antes do habitual para que todos pudessem se arrumar, principalmente as mulheres. As roupas tinham que ser diferentes daquelas do trabalho.

Nessas festas, temos personagens que habitam todas as empresas, em qualquer lugar do mundo. Aprendi isso nos quatro lugares em que trabalhei: o cara tímido que se solta no segundo gole, e dá vexame no final; o chefe que fica sem graça quando as meninas do trabalho o chamam para dançar;  o gerente que cai matando na estagiária; a semi-periguete que fica atrás do gerente bem casado; e a totalmente periguete com uma microssaia e uma escova que levou três horas para ficar pronta, focada no recém-contratado novinho, com cara de nerd.

Não reparei em quem pegou quem. Afinal, estava atento a todos os detalhes. Mesmo assim dancei bastante com todas as mulheres do escritório.

No final, tudo deu certo: os porres de sempre, as críticas de sempre, os amassos de sempre, os vexames de sempre. Mas acertei em uma coisa. A festa caiu numa sexta-feira. Todos tiveram o fim de semana inteiro para esquecer o que fizeram e esquecerem os micos de todos.

Foi legal. Mas nunca mais quis repetir a dose.

Fim de Ano II

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Sem comentários

  • Oscar Rodriguez Barreneche disse:

    Gostei do que você escreveu. É exatamente isso o que acontece. Gente que bebe demais e faz cagada, fofoca por todo lado, paqueras políticamente incorretas, e o principal, custa um dinheirão e ninguém fica satisfeito. Como Presidente das companhias em que trabalhei, participei diretamente na organização e na aprovação dos eventos, e essas experiências se repetem, seja no México, Venezuela, Ecuador, Panamá, etc, etc. Mas no fundo a gente se diverte … e tem historia para contar!

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