O ano de 2014 não começou bem para a economia brasileira. Aliás, 2013 terminou mal. Portanto, o que vemos é apenas a continuação do que se vê há mais de doze meses. Depois da agência de classificação de risco Moody’s falar mal do Brasil na metade de 2013, dessa vez foi a Standard & Poor’s que demonstrou desconfiança. Isso será assunto por muitos dias e, com certeza, ouviremos explicações do governo de que “eles” continuam não entendendo a mudança social produzida no país.
Em matéria de economia as opiniões são tão diversas e tão apaixonadamente defendidas como a escalação da Seleção Brasileira às vésperas de Copa do Mundo, com o agravante de que até se pode concordar com os convocados, mas o esquema tático varia de acordo com cada opinião.
Como já tive oportunidade de afirmar aqui, a economia é uma ciência social, sem a possibilidade de testes em laboratórios e onde as condições normais de temperatura e pressão duram não mais do que alguns dias.
Assim para não recuarmos muito no tempo e nem nos aprofundarmos nas condições políticas do país, me limitarei aos principais problemas que afligem atualmente nossa economia. Sabemos que a passagem dos governos de FHC para o primeiro mandato de Lula se deu sob a égide de um tripé que estava caminhando bem: perseguição a uma meta inflacionária de 4,5%aa com 2 pp de tolerância para cima ou para baixo; câmbio flutuante, e meta de 3,1% do PIB de superávit primário. Muito mais do que uma fórmula, esses pontos colocavam o país dentro do radar de investimentos internacionais.
Da metade para o final do segundo mandato de Lula, já com o ministro Guido Mantega à frente da pasta da Fazenda e em meio a maior crise econômica mundial desde 1929, o governo optou por uma mudança radical deste tripé, em vez de ajustá-lo aos acontecimentos. Não cabe aqui julgamentos econômicos profundos e sim uma análise rápida de que um projeto de poder estava em jogo e medidas de curto alcance econômico mas de largo espectro eleitoral passaram a ser o foco do governo. E o momento não se prestava de forma alguma a esse tipo de aventura.
Fazendo menção à figura do equilibrista de pratos no circo, e ao fato de que as condições econômicas se alteram depressa, o governo começou lentamente a modificar parâmetros que hoje se mostram problemáticos e de solução de médio e longo prazo somente à custa de muita disciplina, característica pouco incentivada nos nossos governos.
Começo pela inflação: já tive oportunidade de dizer que houve abandono da meta e agora só se pretende mantê-la abaixo de 6,5%aa, algo temerário, pois preços administrados (tarifas públicas) têm reajustes contratuais, logo o que não é dado em um período, se acumula para o seguinte, deixando muito pouco espaço para o imponderável (choques de oferta de alimentos, por exemplo). Dessa forma, em 2013 o governo encerrou o quarto ano consecutivo com inflação próxima a 6%aa mesmo sem conceder reajustes dos transportes públicos e colocando na conta do Tesouro o reajuste da energia elétrica. A contrapartida seria uma redução das despesas de custeio dos governos municipais, estaduais e federal. Não foi o que se viu. Logo, os preços livres ficaram acima de 6%aa, pressionando salários e a indústria, que se viu obrigada a reduzir investimentos. Remédio dado: aumento dos juros, que continuará em 2014.
Ao falar do câmbio flutuante, devemos recuar a 2012 quando o Banco Central fez um esforço grande para desvalorizar o real, a fim de melhorar a situação da indústria que sofria com crescimento das importações e queda nas exportações, e principalmente perda de competitividade. Já se sabia que não seria apenas essa variável que modificaria o panorama da indústria. Logo o que se viu, e se vê, é uma desarrumação de preços relativos, com a desvalorização do real pressionando a inflação, e a indústria ainda com os mesmos problemas, como baixa produtividade e problemas de infraestrutura.
Finalmente, as metas de superávit primário foram demolidas pelo governo federal de maneira insana. Primeira manobra: lançou-se mão da “contabilidade criativa”, que resultou em perda de credibilidade internacional, e “secou” fontes de recursos, como dividendos do Banco do Brasil e da Eletrobrás. Segunda manobra, retirar uma fatia muito grande da meta em nome de investimentos do PAC. Esses investimentos não estão sendo feitos conforme pareceres do Tribunal de Contas da União. Terceira manobra, reduzir a meta de superávit. Em nenhum momento, foi considerada a hipótese de redução de despesas. E finalmente a quarta manobra: retirar a obrigatoriedade de recompor déficits de municípios e estados. Mesmo com tudo isso a parca meta foi alcançada por receitas extraordinárias de Refis e bônus do Campo de Libra, que não se repetirão.
A conclusão é que se o governo conseguir levar 2014 em “banho-maria” entregará ao próximo presidente, seja lá quem for, uma economia totalmente desarrumada em seus preços relativos, finanças públicas e contas externas. Nem sendo otimista, nem sendo repetitivo nos assuntos, temos possibilidades melhores do que uma economia que perderá mais espaço nos próximos anos, não só entre os chamados emergentes, como também entre os desenvolvidos que já enxergam melhoras no médio prazo.
Se quiserem aprofundar as discussões temos o problema Petrobrás, o problema BNDES e as falsas promessas de investimentos com os leilões de concessões que produzirão algo para o país a partir de 2015, se este ano não for jogado fora. É muito problema. É muito “se”. É muita fome de votos.